Fosso geracional na Calle Mayor 84

São raras as vezes que vou a Madrid e não janto no centenário Círiaco (abriu em 1906).

Sábado (28) deleitava-me com meia perdiz "escabechada" quando um casal português (ela a rondar os 30, ele um pouco mais velho) se senta na mesa ao lado. Ela deita o olho para o meu prato e decide que também quer. Ele não faz a mínima ideia do que há-de comer e com a leitura do extenso cardápio fica ainda mais indeciso. Convém dizer que só os clientes habituais se apercebem de que o dono é um dos empregados de casaco impecavelmente branco que servem à mesa. Ofereço-me para ajudar revelando as nossas escolhas prévias à perdiz: croquetas de merluza (pescada) e alcachofras com pedacinhos de presunto. Ela agradece, ele revela-se ostensivamente mal-educado. Baixam a voz para pedir outra entrada...

Mais adiante no repasto recebem chamadas nos telemóveis. Percebe-se que haviam deixado os miúdos com os avós e o mais pequeno habituado a roer a casca dos pinheiros apanhou lagarta nos beiços e agora mal podia comer. Ela fica bastante perturbada.

Podia ajudar mas já não me ofereço, consciente do fosso que há entre mim e esta geração senhora do seu nariz que sabe tudo menos como pagar o empréstimo e a prestação do carro sem aumentar todos os meses o saldo cartão de crédito. Há excepções honrosas, claro, mas estes dois são exemplares típicos.

Bastaria pôr-lhe as mãos na nuca e concentrar-me um pouco. Não. Estou a delirar. Reiki no Círiaco?...

Como diz o slogan "En Madrid todo es posible"!